Com calma e alma

Leonard Cohen é uma espécie de antítese dos tempos modernos. Na era da velocidade, das muitas coisas ao mesmo tempo, e também da superficialidade, o velho poeta e músico canadense parece não ter pressa. Talvez por isso lance discos esparsos, entre grandes intervalos de tempo. Até mesmo para começar a carreira dentro do rock, ele foi do contra. Enquanto o lugar-comum dita ídolos bem jovens, sucesso antes dos 25, ele só empunhou um violão e se lançou em uma carreira musical depois dos 30 anos, com “Songs Of Leonard Cohen”, de 1968. O impacto foi gigantesco, e reverbera até hoje. Aos 77 anos de idade, e depois de 8 anos sem um disco de inéditas, Cohen está lançando “Old Ideas”, seu décimo segundo álbum de estúdio.

O disco foi gravado depois de uma turnê mundial de sucesso (que resultou em um dos grandes discos ao vivo dos últimos tempos, “Live in London”) responsável por resgatar, de certa maneira, o legado de Cohen para novas gerações e também o cofre do artista – que se descobriu em apuros financeiros depois de ser roubado por seu antigo empresário.

Cohen, que já era um escritor e poeta respeitado antes de se tornar músico, continua afiado nas letras. Temas trabalhados, conflitos humanos, a submissão a uma religiosidade profunda e sincera — coisas que marcam seu trabalho desde o inicio — estão em canções como “Going Home” e “Amen”, que já abrem o disco com alto nível e uma suposta explicação para as vantagens que a falta de pressa de Cohen em lançar coisas novas a todo tempo podem trazer. Beirando os 80 anos, Cohen também já sente a morte mais perto, e o primeiro single do disco, “Darkness”, trata exatamente disso. Nela, entre outras coisas, ele declara que não tem futuro, e que lhe restam poucos dias.

Durante todo o álbum, ele utiliza vocais femininos, coisa que já era uma característica, mas que aqui aparece mais forte e em forma de coral em muitas ocasiões. A sonoridade é intimista, em alguns momentos com o uso de cordas, outros com instrumentos mínimos para acompanhar a voz cada vez mais rouca do cantor – que em “Show Me The Place” lembra bastante a de um de seus discípulos, Tom Waits.

A música de Leonard Cohen sempre teve uma elegância que seus pares não atingiram por serem mais instintivos do que propriamente intelectuais. Essa característica também existe em “Old Ideas”. Em muitos momentos, como “Lullaby” e “Banjo”, por exemplo, a sofisticação por baixo da aparente simplicidade é evidente por detalhes de arranjos e também pela presença calma do coral de vozes femininas.

Mais uma vez, Leonard Cohen se mostra afinado com um ritmo próprio, longe das exigências comercias e marketeiras dos dias atuais e com uma calma que só um poeta que pode esperar anos para colocar uma palavra em um poema pode ter. Cohen conhece o valor da paciência, e esperar por suas canções sempre compensa. (Por Alê Duarte)

 

Thousands

Out of the thousands

who are known,

or who want to be known

as poets,

maybe one or two

are genuine

and the rest are fakes,

hanging around the sacred precincts

trying to look like the real thing.

Needless to say

I am one of the fakes,

and this is my story.

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Milhares

 

Entre os milhares

conhecidos,

ou que querem ser conhecidos

como poetas,

talvez um ou dois

sejam genuínos

e os outros são falsos,

rodeando os recintos sagrados

tentando parecer verdadeiros.

Nem preciso dizer

Que sou um dos falsos,

e esta é a minha história

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Tradução de Wagner Miranda

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